Os deuses detestam o tempo
porque este não faz acepção
de pessoas... Apolo, por exemplo,
não suporta se olhar no espelho
e avistar aquelas minúsculas
galinhas ciscando entre as pregas
das ruguinhas que vão acumulando
sanfonas surdas, absurdas e desafinadas
nos cantos de cada olho...
E apesar da quantidade espantosa
de anabolizantes, esteróides,
hormônios e outras "bombas"
que ele costuma desesperadamente localizar,
suas nádegas (que outrora
só não encantaram Narciso
porque este gostava mesmo era
do coqueiro do parque da frente,
como diriam poeticamente os chineses)
já começaram a dar ouvidos
ao apelo do chão,
e se puseram, flácidas e tremulantes,
a despencar, despencar, despencar
como se estivessem a atender
o chamado do pó da metade cavalo
do finado Nesso
o centauro para o qual ele -Apolo-
costumava fazer o equino e incorreto
papel de Djanira
a Ninfa que foi uma verdadeira Dalila
na vida trágica, quase semita, de Hércules...
joselindomarcabraldacosta@yahoo.com.br